segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Mito da caverna



Imagine um muro bem alto dentro de uma caverna, separando o mundo externo e o interior dessa caverna. Na caverna existe uma fresta por onde passa um feixe de luz exterior. No interior da caverna permanecem seres humanos, que nasceram e cresceram ali.
Ficam de costas para a entrada, acorrentados, sem poder locomover-se, forçados a olhar somente a parede do fundo da caverna, onde são projetadas sombras de outros homens que, além do muro, mantêm acesa uma fogueira.
Os prisioneiros julgam que essas sombras sejam a realidade.
Porém um dia um dos prisioneiros decide abandonar essa condição e fabrica um instrumento com o qual quebra os grilhões. Aos poucos vai se movendo e avança na direção do muro e o escala, com dificuldade enfrenta os obstáculos que encontra e sai da caverna, descobrindo não apenas que as sombras eram feitas por homens reais como eles, e mais além vislumbra pela primeira vez todo o mundo e a natureza.
O Mito da Caverna trata-se de um diálogo metafórico. No diálogo, é dada ênfase ao processo de conhecimento, mostrando a visão de mundo do ignorante, que vive no senso comum, e do filósofo, na sua eterna busca pela verdade.

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Sócrates – Agora imagina a maneira como segue o estado da nossa natureza relativamente à instrução e à ignorância. Imagina homens numa morada subterrânea, em forma de caverna, com uma entrada aberta à luz; esses homens estão aí desde a infância, de pernas e pescoços acorrentados, de modo que não podem mexer-se nem ver senão o que está diante deles, pois as correntes os impedem de voltar a cabeça; a luz chega-lhes de uma fogueira acesa numa colina que se ergue por detrás deles; entre o fogo e os prisioneiros passa uma estrada ascendente. Imagina que ao longo dessa estrada está construído um pequeno muro, semelhante às divisórias que os apresentadores de títeres armam diante de si e por cima das quais exibem as suas maravilhas.
Glauco – Estou vendo.
Sócrates – Imagina agora, ao longo desse pequeno muro, homens que transportam objetos de toda espécie, que os transpõem: estatuetas de homens e animais, de pedra, madeira e toda espécie de matéria; naturalmente, entre esses transportadores, uns falam e outros seguem em silêncio.
Glauco - Um quadro estranho e estranhos prisioneiros.
Sócrates - Assemelham-se a nós. E, para começar, achas que, numa tal condição, eles tenham alguma vez visto, de si mesmos e de seus companheiros, mais do que as sombras projetadas pelo fogo na parede da caverna que lhes fica defronte?
Glauco - Como, se são obrigados a ficar de cabeça imóvel durante toda a vida?claro idiotas
Sócrates - E com as coisas que desfilam? Não se passa o mesmo?
Glauco - Sem dúvida.
Sócrates - Portanto, se pudessem se comunicar uns com os outros, não achas que tomariam por objetos reais as sombras que veriam?
Glauco - É bem possível.
Sócrates - E se a parede do fundo da prisão provocasse eco sempre que um dos transportadores falasse, não julgariam ouvir a sombra que passasse diante deles?
Glauco - Sim, por Zeus!
Sócrates - Dessa forma, tais homens não atribuirão realidade senão às sombras dos objetos fabricados?
Glauco - Assim terá de ser.
Sócrates - Considera agora o que lhes acontecerá, naturalmente, se forem libertados das suas cadeias e curados da sua ignorância. Que se liberte um desses prisioneiros, que seja ele obrigado a endireitar-se imediatamente, a voltar o pescoço, a caminhar, a erguer os olhos para a luz: ao fazer todos estes movimentos sofrerá, e o deslumbramento impedi-lo-á de distinguir os objetos de que antes via as sombras. Que achas que responderá se alguém lhe vier dizer que não viu até então senão fantasmas, mas que agora, mais perto da realidade e voltado para objetos mais reais, vê com mais justeza? Se, enfim, mostrando-lhe cada uma das coisas que passam, o obrigar, à força de perguntas, a dizer o que é? Não achas que ficará embaraçado e que as sombras que via outrora lhe parecerão mais verdadeiras do que os objetos que lhe mostram agora?
Glauco - Muito mais verdadeiras.
Sócrates - E se o forçarem a fixar a luz, os seus olhos não ficarão magoados? Não desviará ele a vista para voltar às coisas que pode fitar e não acreditará que estas são realmente mais distintas do que as que se lhe mostram?
Glauco - Com toda a certeza.
Sócrates - E se o arrancarem à força da sua caverna, o obrigarem a subir a encosta rude e escarpada e não o largarem antes de o terem arrastado até a luz do Sol, não sofrerá vivamente e não se queixará de tais violências? E, quando tiver chegado à luz, poderá, com os olhos ofuscados pelo seu brilho, distinguir uma só das coisas que ora denominamos verdadeiras?
Glauco - Não o conseguirá, pelo menos de início.
Sócrates - Terá, creio eu, necessidade de se habituar a ver os objetos da região superior. Começará por distinguir mais facilmente as sombras; em seguida, as imagens dos homens e dos outros objetos que se refletem nas águas; por último, os próprios objetos. Depois disso, poderá, enfrentando a claridade dos astros e da Lua, contemplar mais facilmente, durante a noite, os corpos celestes e o próprio céu do que, durante o dia, o Sol e sua luz.
Glauco - Sem dúvida.
Sócrates - Por fim, suponho eu, será o sol, e não as suas imagens refletidas nas águas ou em qualquer outra coisa, mas o próprio Sol, no seu verdadeiro lugar, que poderá ver e contemplar tal qual é.
Glauco - Necessariamente.
Sócrates - Depois disso, poderá concluir, a respeito do Sol, que é ele que faz as estações e os anos, que governa tudo no mundo visível e que, de certa maneira, é a causa de tudo o que ele via com os seus companheiros, na caverna.
Glauco - É evidente que chegará a essa conclusão.
Sócrates - Ora, lembrando-se de sua primeira morada, da sabedoria que aí se professa e daqueles que foram seus companheiros de cativeiro, não achas que se alegrará com a mudança e lamentará os que lá ficaram?
Glauco - Sim, com certeza, Sócrates.
Sócrates - E se então distribuíssem honras e louvores, se tivessem recompensas para aquele que se apercebesse, com o olhar mais vivo, da passagem das sombras, que melhor se recordasse das que costumavam chegar em primeiro ou em último lugar, ou virem juntas, e que por isso era o mais hábil em adivinhar a sua aparição, e que provocasse a inveja daqueles que, entre os prisioneiros, são venerados e poderosos? Ou então, como o herói de Homero, não preferirá mil vezes ser um simples lavrador, e sofrer tudo no mundo, a voltar às antigas ilusões e viver como vivia?
Glauco - Sou de tua opinião. Preferirá sofrer tudo a ter de viver dessa maneira.
Sócrates - Imagina ainda que esse homem volta à caverna e vai sentar-se no seu antigo lugar: Não ficará com os olhos cegos pelas trevas ao se afastar bruscamente da luz do Sol?
Glauco - Por certo que sim.
Sócrates - E se tiver de entrar de novo em competição com os prisioneiros que não se libertaram de suas correntes, para julgar essas sombras, estando ainda sua vista confusa e antes que seus olhos se tenham recomposto, pois habituar-se à escuridão exigirá um tempo bastante longo, não fará que os outros se riam à sua custa e digam que, tendo ido lá acima, voltou com a vista estragada, pelo que não vale a pena tentar subir até lá? E se alguém tentar libertar e conduzir para o alto, esse alguém não o mataria, se pudesse fazê-lo?
Glauco - Sem nenhuma dúvida.
Sócrates - Agora, meu caro Glauco, é preciso aplicar, ponto por ponto, esta imagem ao que dissemos atrás e comparar o mundo que nos cerca com a vida da prisão na caverna, e a luz do fogo que a ilumina com a força do Sol. Quanto à subida à região superior e à contemplação dos seus objetos, se a considerares como a ascensão da alma para a mansão inteligível, não te enganarás quanto à minha idéia, visto que também tu desejas conhecê-la. Só Deus sabe se ela é verdadeira. Quanto a mim, a minha opinião é esta: no mundo inteligível, a idéia do bem é a última a ser apreendida, e com dificuldade, mas não se pode apreendê-la sem concluir que ela é a causa de tudo o que de reto e belo existe em todas as coisas; no mundo visível, ela engendrou a luz; no mundo inteligível, é ela que é soberana e dispensa a verdade e a inteligência; e é preciso vê-la para se comportar com sabedoria na vida particular e na vida pública.
Glauco - Concordo com a tua opinião, até onde posso compreendê-la.
[Platão, A República, v. II p. 105 a 109]
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E esta é a nossa situação.
Estamos todos acorrentados dentro da caverda da nossa realidade perceptivel, aquela que nossos sentidos nos mostram, acorrentados aos dogmas religiosos que outros utilizam para nos dominar e tirar proveito da nossa ignorância, acorrentados àquilo que aprendemos como certo desde criança.
Um dia alguém por algum motivo, começa a se questionar sobre toda essa situação.
Quanto mais se questiona mais ele vai percebendo que há algo de errado nele e no mundo em que vive e ele começa a procurar entender o que é isso. As outras pessoas acorrentadas mais próximas já começam a olhar diferente pra ele, uns zombam, outros criticam, alguns até se afastam dele. Ele não liga, está determinado a descobrir e começa a se remexer na cadeira. Quanto mais se remexe na cadeira, mais ele sente que realmente há algo de estranho com ele. Até que um dia percebe que está acorrentado.
Que decepção, mas também que descoberta inquietante.
De repente você se descobre preso, acorrentado, oprimido. Qual a sua reação? Você quer se libertar das correntes.
Depois de muita luta, consegue primeiramente livrar os braços e o pescoço. Assim, de repente você já pode olhar de lado e pra trás e agora pode ver, as pessoas acorrentadas à sua volta, a fogueira, enfim, ter uma visão da caverna e perceber que esse mundo é uma ilusão.
Depois, pouco a pouco e com muita luta, vai se livrando das outras correntes até estar completamente livre.
Você nasceu e cresceu nessa situação, nunca andou. Agora quando se levanta e começa a tentar andar tem muita dificuldade, mas vai em frente, não desistirá agora.
Você tenta alertar os outros acorrentados, inclusive os amigos, porém, sem sucesso. Eles não sabem das correntes e sentem-se em um relativo conforto e tomam esse mundo como real.
Quando ouvem você dizer que o mundo não é real, que vivem numa caverna úmida e escura, eles chegam até a chamá-lo de louco.
Você percebe que não vai ter sucesso tentando imediatamente convencer as pessoas ao seu redor.
Você vê então, um pequeno feixe de luz, um sinal vindo do topo da caverna, decide ir em direção a essa luz, para isso você precisa escalar o paredão íngreme da caverna, cheio de obstáculos e muitas são as dificuldades. Nesta escalada, as vezes escorrega, cai entre as muitas pedras no caminho, mas volta a escalar, você está determinado a ir até o fim, agora que descobriu a verdade. Após muita luta e esforço, chega ao topo e consegue sair da caverna.
Você vê o sol pela primeira vez, nossa que luz ofuscante e maravilhosa, nesse momento quase fica cego, pois nunca tinha visto tanta luz.
Depois de um tempo do lado de fora, consegue se adaptar um pouco à luz do sol, mas ainda tem a visão não muito boa, ainda não pode ver claramente, mas você vê a natureza e as pessoas. Experimenta as sensações, percebe agora a amplidão de tudo, conversa com alguns sábios habitantes do lado de fora da caverna e descobre finalmente que aquele é o mundo real.
Tudo está claro e bom, você se sente infinitamente bem e em paz. Mas um sentimento de misericórdia o aflinge: e os amigos e todas as outras pessoas acorrentadas naquela caverna escura, úmida e fria? Pensando que aquele é o mundo real? Sendo enganados, oprimidos e dominados por outros?
Você decide então voltar.
A descida é tão difícil quanto a subida do paredão, mas você os ama e não pode deixá-los para trás.
Chegando aos amigos acorrentados, ainda com a vista ofuscada pela luz, todo machucado da difícil escalada, tenta libertar alguns acorrentados.
Porém agora percebe que a reação é ainda pior do que antes, quando tentou alerta-los antes de subir. Vê que alguns são até capazes de lutar ferozmente para proteger as correntes.
Então, chega a conclusão que o segredo é contar a poucas pessoas de cada vez e mesmo assim liberar o conhecimento aos poucos, começando inicialmente a tentar que eles percebam as correntes.
Observa então que existem algumas pessoas que também se questionam e tem uma certa disposição a ouvi-lo. Uma dessas pessoas consegue também soltar os braços e o pescoço. Assim uns vão se soltando, ajudando os mais próximos e também, caminhando em direção ao feixe de luz. Criando assim uma corrente.
O que se solta primeiro é o filósofo.
A luz do sol é a verdade.
As sombras, o mundo de ilusão.
A luz da fogueira, os nossos desejos.
As correntes, a ignorância.
Os acorrentados, a humanidade.

A filosofia é a mãe de todas as ciências, a reposta está dentro de nós.
Como diria Sócrates: "Conhece-te a ti mesmo".

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